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quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

O AMOR E A VIDA DEPOIS DELE

Outro dia, caminhando despretensiosamente na rua, me esbarrei com aquele casal de amigo que dividimos. Após muitas perguntas, muitos abraços, muitas risadas, um deles perguntou: E aí, como tem sido a vida sem ele? - vi que minha amiga correu o olho nele, como que o repreendendo por ter me feito essa pergunta, como se fosse proibido falar daquilo comigo. Eu só sorri, sem graça e respondi: - Minha vida continua seguindo o caminho que tem que seguir.
Ficamos um tempo em silêncio, eles me olhavam como se quisessem me consolar mas, graças a Deus, não fizeram isso. Nos despedimos e seguimos caminhos opostos.
Fiquei pensando durante todo o meu percurso até em casa: afinal, como é que está minha vida depois dele? Cheguei a conclusão que o amor precisa ser curado aos poucos, e comecei a me lembrar de tudo que passei até chegar aqui, neste momento.
A primeira semana foi devastadora. Parecia que havia um buraco imenso dentro do meu peito, dentro da minha alma, e que só a presença dele poderia preencher. Eu arrumava mil e uma desculpas para bisbilhotar as redes sociais, estava sempre tentando saber como ele estava, me deslocava até a casa dele para falar com sua mãe. Parecia que meu mundo, que tudo que eu tinha, tudo que eu construí antes dele, todos os meus sonhos, nada daquilo fazia sentido. Isso durou bastante. Eu não conseguia mais conversar com outros caras, eu não me sentia atraída por ninguém, até as festas não tinham graça. Tudo nele me fazia falta. O som da sua risada, sua voz me acordando pela manhã, o jeito como ele me fazia rir de coisas que não tinha graça, as manias estranhas que ele tinha, o modo como ele nem precisava estar perto para me fazer sentir especial. Eu sentia falta até dos defeitos.
Infelizmente é isso, quando perdemos alguém, tudo que aquela pessoa fez e significou toma uma proporção gigantesca. Parece que o amor multiplica, os momentos felizes criam raízes, a vida perde a graça e você nao sabe mais como é viver sem aquela pessoa. Você nao se reconhece mais. Você está em processo de readaptaçào, mas não quer ficar bem, porque ficar bem significa esquecê-lo. Ter que deixar tudo que viveram para trás. Você não quer esquecer. Eu, particularmente, não queria.
Porque esquecê-lo significava nunca mais me lembrar do sorriso preguiçoso dele nas manhãs de domingo, ou dos apelidos carinhosos, tão criativos, que só ele era capaz de inventar. Esquecê-lo significava esquecer o barulho irritante que ele faz quando está nervoso, ou a tagarelice dele quando tenta se explicar se estiver errado. Esquecê-lo significava não lembrar mais do gosto do beijo dele, ou melhor, não lembrar mais como é beija-lo. É não conseguir lembrar da voz dele; rouca quando estava com tesão, grave quando estava irritado, branda quando dizia que me amava. Esquecê-lo seria esquecer nossos planos, nossos projetos, nossos sonhos. E parecia errado. Parecia errado ter que me acostumar a viver sem ele.
As vezes, eu ligava só para ouvir a voz dele. Queria dizer que estava com saudade, que essa distância toda não podia vencer o amor que dizíamos sentir um pelo outro. Mas eu me acovardava, ficávamos na linha, ouvindo o silêncio um do outro. Ambos sem coragem para dizer que ama ou para se despedir de vez.
E a vida? A vida continuou seguindo. Mesmo quando eu queria me esconder no mundo ou do mundo (tanto faz), chorar feito uma criancinha, fazer birra pra ele voltar... eu não podia. A vida não espera, os compromissos não esperam, o tempo não para. Não dá pra sentar na frente da tv e pausar o tempo para que o coração consiga se reestruturar. Não. Você tem que seguir, tem que continuar caminhando mesmo sentindo falta de ar, mesmo achando que não aguenta mais, mesmo quando dói. Você tem que continuar de pé.
É assim que minha vida está agora, depois que ele se foi. O lado bom? Eu pude me conhecer novamente. Eu consegui me resgatar. Me curar. Me satisfazer. Consegui dar oportunidade para outras pessoas, e até para eu mesma. Consegui preencher o vazio dele com a minha presença, e isso tem sido suficiente para mim.
Ainda hoje, depois de todo esse tempo, há momentos que tenho uma daquelas recaídas. Ligo pra ele e fazemos aquilo que fazíamos no começo, ficamos em silêncio, ouvindo a respiração um do outro... Eu fecho os olhos, e me permito, naquele instante, imaginar ele aqui do meu lado, respirando no meu pescoço enquanto dorme... ficamos na linha até dormir, ou até algum de nós ter coragem de desligar. Nós nunca dissemos adeus um para o outro, mas em silêncio ainda estamos gritando: - eu sempre vou te amar.